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sábado, 26 de março de 2011

Marcos Terena: Carta a ONU com nossas preocupações e solicitações

Via Marcos Terena:

Brasília 25 de Março de 2011 -

"Estoy actualmente realizando un estudio sobre los derechos de los pueblos indígenas en relación con proyectos de desarrollo y de extracción de recursos naturales que les afecta, en virtud del alto nivel de información que he recibido de parte de los pueblos indígenas expresando su preocupación sobre este tema.

James Anaya, Relator Especial da ONU. indigenous@ohchr.org.



Resposta de Marcos Terena:



Entrego ao Senhor Carta a ONU com nossas preocupações e solicitações.



"Carta a ONU

Denunciamos as falhas no processo democrático que o governo está levando à frente. Apontar falta de consulta dos povos indígenas e comunidades tradicionais impactados com a obra, como determina a Constituição brasileira e vários tratados internacionais como a Convenção 169 da OIT.



Denunciamos o enorme impacto ambiental, devastando uma grande parte da floresta amazônica e basicamente aniquilando o rio Xingu. Comprometendo, aliás, a meta do próprio governo para reduzir a emissão de gases estufa, como gás carbônico e metano.



Denunciamos ainda o grande impacto social, como a remoção forçada de 30 mil moradores. E questionam ainda a viabilidade econômica da obra, visto que na época seca, a hidrelétrica produzirá pouquíssima energia.

Há muitas outras formas para assegurar essa quantidade de energia, sem tamanha destruição.



Solicitamos que a construção da barragem hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, no estado do Pará, seja imediatamente suspenso devido aos devastadores riscos sociais, ambientais e econômicos que o projeto representa para a região Amazônica.



Em julho de 2009, o então Presidente da Republica Luis Inácio Lula da Silva , reuniu-se em Brasília com representantes da sociedade civil brasileira e com líderes das comunidades indígenas da bacia do rio Xingu, e lhes prometeu a reabertura do diálogo sobre o ameaçador mega-projeto hidrelétrico. Na ocasião ele lhes garantiu que “Belo Monte não seria forçada goela abaixo de ninguém”. Entendemos que esse compromisso significava que a usina de Belo Monte somente seria aprovada uma vez que as comunidades afetadas tivessem sido devidamente consultadas sobre o projeto, compreendido suas implicações e concordado com sua construção.

Entretanto, menos de um ano mais tarde, o governo deu sinal verde para o projeto, apesar da indignação das comunidades locais, da preocupação e dos alertas explícitos dos especialistas brasileiros. Dois altos funcionários do IBAMA – Leozildo Tabajara da Silva Benjamin e Sebastião Custódio Pires – chegaram a pedir demissão de seus cargos no ano passado devido ao alto nível de pressão política para a aprovação do projeto. Fica claro que há sérias preocupações e críticas oriundas de vários grupos e figuras importantes da sociedade civil brasileira, inclusive da parte de Dom Erwin Krautler, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e de Leonardo Boff, entre outros. Independente dessas preocupações expressas por seus compatriotas e da promessa feita anteriormente, percebemos que o governo pretende de fato forçar Belo Monte goela abaixo das comunidades indígenas e ribeirinhas da Amazônia que são diretamente afetadas.



E agora com o governo da Dilma, em janeiro de 2011, a Comissão Especial “Atingidos por Barragens” do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), lançou um importante relatório que concluiu, após análise de diversos estudos de caso, inclusive da Hidrelétrica de Tucurui, que “o padrão vigente de implantação de barragens tem propiciado de maneira recorrente graves violações de Direitos Humanos, cujas conseqüências acabam por acentuar as já graves desigualdades sociais, traduzindo-se em situações de miséria e desestruturação social, familiar e individual.”



Como a usina do Estreito no rio Tocantins, as usinas de Santo Antônio e Jirau no Rio Madeira, o Complexo Belo Monte no rio Xingu e as hidreletricas propostas para os rios Tapajós, Jamanxim e Teles Pires – respaldam plenamente esta e outras conclusões da Comissão Especial “Atingidos por Barragens” do CDDPH.



Sem desconsiderar as relevantes contribuições da hidroeletricidade para a matriz energética brasileira, é motivo de grande espanto e preocupação a verdadeira corrida para construir uma quantidade enorme e sem precedentes de novas hidreletricas na Amazônia nos próximos anos: em torno de 70 grandes barragens (UHEs) e 177 PCHs, inclusive 11 grandes hidrelétricas somente na bacia do Tapajós/Teles Pires, segundo dados do PNE e do PDE. O peso descomunal nesses planos para a construção de novas hidreletricas na região amazônica reflete, entre outras causas, o fato de que o planejamento do setor elétrico é realizado sem participação democrática – como demonstra a falta de nomeação de representantes da sociedade civil e da universidade brasileira no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), contrariado o Decreto no. 5.793 de 29 de maio de 2006. Alem disso, reflete a proximidade, ou como dizem alguns “relações promíscuas”, entre o setor elétrico do governo (MME/EPE/Eletrobrás) comandado atualmente pelo grupo Sarney, e grandes empreiteiras como Odebrecht, Camargo Correia, Andrade Gutierrez, que, vale lembrar, se classificam entre os primeiros lugares do “ranking” de grandes doadores para campanhas eleitorais, inclusive as dos PT e do PMDB. O resultado desse quadro político-institucional é que decisões no planejamento do setor elétrico são tipicamente orientados mais por uma lógica privada do que critérios de eficiência econômica, justiça social e sustentabilidade ambiental, ou seja, interesses públicos estratégicos, consagrados no arcabouço legal a partir da Constituição Federal de 1988.



Estamos extremamente preocupados não apenas com a decisão de construir um mega-projeto tão destrutivo do ponto de vista ambiental, mas também com a falta de ética que permeou o processo de licitação do projeto através do qual o governo excluiu a sociedade civil de qualquer debate aberto. Aqueles que serão os mais afetados pela construção de Belo Monte – o povo do Baixo Xingu – foi particularmente alijados do processo de tomada de decisão. O povo da Bacia do rio Xingu se opõe à Belo Monte há mais de 20 anos por razões que são válidas até hoje. O Brasil votou pela Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP), que protege o direito desses povos à auto-determinação, incluindo consulta livre, prévia e informada e que passou a integrar a lei Internacional dos Direitos Humanos.



O Brasil também faz parte da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho que garante aos povos indígenas o direito a consulta livre, prévia e informada com relação a projetos de desenvolvimento ou de infra-estrutura que gerem impactos sobre suas vidas e subsistência, tais como a proposta barragem de Belo Monte. Líderes de grupos indígenas locais deixaram claro que esse direito de consulta foi completamente desconsiderado na aprovação da licença prévia de Belo Monte e na sanção dos seus impactos sobre territórios indígenas.

As populações tradicionais e os povos indígenas tiveram seus direitos violados durante todo o processo de licitação e insistimos para que essa situação seja remediada. Acreditamos que a construção da Belo Monte representa uma grave violação de quase todos os artigos da UNDRIP, tais como os artigos 3, 4, 5, 7, 8, 9, 10, 11, 18, 19, 20, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 32, 38, 40, 43 e 44.



O Brasil também viola o artigo 231.3, Capítulo VIII, da Constituição Federal do Brasil de 1988, que garante por lei o direito dos povos indígenas de contestarem a exploração de recursos hídricos em suas terras, e do artigo 10-V da resolução 237 do CONAMA (19 de Dezembro de 1997), que requer a consulta pública sobre as avaliações de impacto ambiental.



A represa de Belo Monte irá inundar uma área de mais de 600 km2 e desviar quase todo o fluxo do Xingu para a usina na barragem através de dois canais artificiais. Esse desvio do fluxo do rio deixará sem água, peixe ou transporte as comunidades indígenas e tradicionais ao longo de uma extensão de 130 km na Volta Grande do Xingu. O rebaixamento do lençol freático poderá vir a destruir a produção agrícola da região, afetando os produtores indígenas e não indígenas, assim como a qualidade da água. É muito provável que as florestas tropicais da região tampouco sobrevivam.



A formação de pequenos lagos de água parada entre as rochas da Volta Grande propiciarão um meio perfeito para a proliferação da malária e de outras doenças cujo vetor se desenvolve na água parada. As comunidades a montante, inclusive os índios Kayapó, sofrerão com a perda das espécies migratórias de peixe que são parte fundamental de sua dieta.



Além dos impactos devastadores à Volta Grande já mencionados, estima-se que 20.000 pessoas serão forçadas a deixarem suas casas, incluindo habitantes da cidade de Altamira que será parcialmente inundada. Apesar de tudo isso, Belo Monte é considerado como um projeto-modelo pelo Projeto de Aceleração do Crescimento (PAC), ambicioso programa do seu governo que promete trazer um futuro de desenvolvimento para o Brasil com mínimo impacto social e ambiental. A usina de Belo Monte ao declararmos que esses impactos é um preço inaceitável a ser pago por um projeto de viabilidade técnica e econômica duvidosa que oferece benefícios questionáveis aos brasileirosm Investigações independentes concluíram que a avaliação do estudo de impacto ambiental do projeto é incompleta e subestima a extensão dos possíveis impactos da usina de Belo Monte. É do conhecimento de todos que o fluxo ao longo da Volta Grande do Xingu seria gravemente reduzido pelos canais, contudo, os estudos geológicos e sobre a qualidade e o fluxo das águas na Volta Grande permanecem incompletos.



Francisco Hernandez, engenheiro eletricista e co-coordenador de um grupo de 40 especialistas que analisaram o projeto, duvida da viabilidade de Belo Monte e alerta tratar-sede um projeto extremamente complexo que dependeria da construção não somente de uma barragem, mas de uma série de grandes barragens e diques que interromperiam o fluxo de água de uma extensa área e requereria escavações de terra e rochas em escala semelhante aquela necessária na construção do Canal do Panamá. Estamos particularmente preocupados com o descaso do governo com relação ao parecer do painel de especialistas e à análise técnica realizada pelo IBAMA, em novembro último, parte fundamental do processo de licenciamento ambiental.



Belo Monte produzirá somente 10% da capacidade instalada de 11.233 MW de energia durante os três a quatro meses da estação seca. Além disso, ainda não se sabe qual será o custo total do projeto; enquanto a Empresa de Pesquisa Elétrica (EPE) estima R$ 16 bilhões, investidores privados estimam R$ 30 bilhões. O suprimento energético ineficiente e as incertezas sobre os dados ambientais do projeto não justificam tamanho investimento.

Revolta-nos a falta de responsabilidade dos atores corporativos e financeiros que se empenham em concretizar esse projeto, como o banco nacional de desenvolvimento BNDES que planeja utilizar de maneira irresponsável os recursos públicos dos contribuintes brasileiros para financiar a maior parte de Belo Monte. Belo Monte não é um problema não somente para a população do Xingu, mas é também um péssimo investimento para o Brasil.



A realização do projeto de Belo Monte desconsidera alternativas viáveis e menos destrutivas tais como o aumento da eficiência energética e a promoção de fontes renováveis de energia, por exemplo, energia solar e eólica. Um estudo realizado pela WWF-Brasil, publicado em 2007, mostrou que até 2020 o Brasil poderá reduzir a demanda energética prevista em 40% por meio de investimentos em eficiência energética. A energia economizada seria equivalente a 14 hidrelétricas de Belo Monte e representaria uma economia de cerca de R$ 33 bilhões para os cofres brasileiros.



Apesar de existirem alternativas muito mais viáveis e sustentáveis, a hidrelétrica de Belo Monte está sendo proposta como modelo para a matriz energética renovável do Brasil, parte importante da redução de 38% das emissões domésticas brasileiras até 2020. Na verdade, o que se verifica é exatamente o contrário: a barragem emitirá grandes quantidades de metano, gás de efeito estufa 21 vezes mais potente do que o CO2. Grandes barragens também causam destruição ambiental direta e indireta consideráveis, como o desmatamento de grandes áreas e o aumento das emissões de gases de efeito estufa. Não há nada de limpo nem de sustentável em Belo Monte.



No entanto, vemos que a total incapacidade de cumprir essa promessa de diálogo vem aumentando a tensão política em torno da questão de Belo Monte com a possibilidade de mobilizações em massa e confrontos violentos se tornando cada vez mais factíveis.



Em suma, entendemos a constriução desse mega-projeto pelo governo brasileiro como um ato irresponsável e temerário. Forçar Belo Monte goela abaixo de milhares de povos indígenas e famílias ribeirinhas, enquanto o baixo Rio Xingu é destruído, é um preço incomensuravelmente alto a ser pago por uma fonte energética ineficiente, de alto custo e devastadora do ponto de vista ambiental.



O Brasil não precisa de Belo Monte para assegurar o seu futuro energético. Insistimos veementemente para que o governo adote alternativas menos destrutivas para alimentar o crescimento econômico do Brasil, realize a devida consulta às comunidades locais e suspenda de imediato esse projeto desastroso em respeito aos direitos dos habitantes do Rio Xingu e à integridade do ecossistema da região."



Marcos Terrena

coordenador Geral -

Dos povos indígenas Juruna, Xipaya, Arara da Volta Grande, Kuruaia e Xicrin da região de Altamira, Guajajara, Gavião, Krikati, Awa Guajá, Kayapó do MT e PA, Tembé, Aikeora, Suruí, Xavante, Karintiana, Puruborá, Kassupá, Wajapi, Karajá, Apurinã, Makuxi, Nawa AC, Mura do AM, Tupaiu, Borari, Tapuia, Arapiuns, Pataxó, Tupiniquim, Javaé, Kaingang, Xucuru, Marubu, Maiuruna, Mundukuru do AM e do PA e dos demais estados da Amazônia e do Brasil, agricultores, ribeirinhos e moradores das cidades de Itaituba, região do Tapajós, Trairão, Medicilândia, Uruará, Placas, Rurópolis, Gurupá, Altamira, dos travessões do Cobra-Choca (km45 sul), km 27 sul, Paratizão (km23 sul), Assurini e das comunidades do Arroz Cru, Santa Luzia e São Pedro, representantes de organizações indígenas e da COIAB, da APIB, APOINME, ARPIMSUL, do MAB, da Via Campesina, do MXVPS, de pastorais e ONGs, reunidos no Acampamento terra Livre Amazônico, em Altamira/PA

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